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sábado, 28 de novembro de 2015

NUM CANTO ESCONDIDO



          Parece pequeno, escondido, “perdido e não lembrado”... Mas é tão poderoso que aprendemos a escondê-lo para poder sobreviver.  No entanto, num repente, num acaso, tropeçamos num fio do passado que nos leva diretamente para lá – para aquele canto tão escuro, tão doído. Somos então assaltados, avassalados, por lembranças intensas e muito, muito, dolorosas. A emoção nos toma por inteiro, emoções muito poderosas, lembranças “justiceiras”, que, novamente, gritam, nos cobram, nos açoitam...


            Nessa distância, e escondidas, as dores da separação e dos erros são mais gritantes, porque não mais podemos voltar e consertar... Voltar para tentar fazer melhor, fazer diferente...  E, quanto mais vivemos, quanto mais amadurecemos, revendo nossas performances no passado, nas relações com quem tanto amávamos, mais terrível e dolorosa torna-se essa incursão no passado.


            Nossa cabeça entende. Perdoa-nos pelo que não era entendido, pelo que não enxergávamos, pelas nossas fraquezas e nossas falhas...  Mas nosso coração, muitas vezes, não quer ouvir, entender, perdoar, aceitar... Mantém-se, e nos mantem, prisioneiros de uma dor imperdoável, pela vida, por nós mesmos... Esse passado que nos assombra, mesmo escondido, está sempre vivo, ele é atemporal...     Acredito que é por isso que, para sobreviver, para continuar e tentar viver, acabamos por guardá-lo nesse canto, bem escondidinho, mas sempre vivo  e ameaçador.

            Sei que preciso encará-lo, acolhê-lo, compartilhá-lo, para  torná-lo mais claro e, ao mesmo tempo, menos poderoso e punitivo.  Sei que preciso de coragem paciente e amorosa para não continuar nessa fuga de partes de mim. Preciso abri-lo, trazê-lo à luz, visitá-lo, chorar por ele, chorar com ele.   Assim, certamente, pelo tempo afora, em algum momento, esse cantinho escuro, assustador e assombrado, ficará mais ensolarado e meu mundo interior estará menos compartimentado, mais livre e pacificado.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

CARMA




           Ouvimos falar de Carma, um conceito oriental, e o “adaptamos” à nossa visão judaico/cristã de castigo, por pecar, por errar... Uma visão de culpa, prisão, expiação... até de “virtude”!  Acreditamos, assim, que construímos nossos carmas dolorosos e devemos pagar por eles.  Para nós, então, o carma, ficou caracterizado como um peso que arrastamos, merecidamente, pelas situações que criamos nessa vida ou em vidas anteriores, conforme a concepção religiosa de cada um.

            E acreditamos que não devemos fugir dele! Devemos, sim, nos submeter e aturar o carma/castigo, ainda que nos debatendo e/ou  o amaldiçoando: É meu carma, né?!       Essa visão nos leva a uma acomodação à desgraça, sob a desculpa, até religiosa, do “mea culpa” .  Ao mesmo tempo satisfaz, e até nos envaidece, pela nossa “virtude” no sofrimento!      

 Mas submeter-se espontaneamente a uma paralisia doentia em situações dolorosas e humilhantes, não é virtude, não é humildade, não é carma de ninguém!  Isto é uma distorção, um equívoco perverso.

            O conceito verdadeiro que nos foi passado é um conceito libertador ! É oportunidade de rever crenças, de rever nossas atuações, de nos confrontar com nossos erros passados -  por submissão, omissão, manipulação, agressão... Oportunidade de buscar novas soluções que possam transformar erro/culpa em  arrependimento, com responsabilidade em mudar. Oportunidade de buscarmos novas performances na vida, nas relações... Oportunidade de “transformarmos erro/ dor/sofrimento em algo útil e educativo”. 

            A Vida é um eterno processo de aprendizado libertador, que nos é oferecido pelo Amor/ Paciência/Sabedoria de um Poder Maior. Nada nos acontece por acaso e sem um motivo que nos ofereça oportunidades.  Enfim, querer “fechar/resolver” um carma é aprender, modificar-se, libertar-se, para seguir, renovados,  sem mágoas, sem ódios ou ressentimentos...  Acredito numa Sabedoria Superior e Amorosa, que nos plantou aqui, desse modo, com essas pessoas, nessas situações, porque sabe e acredita em nós, em nossa Luz Interior, que nos fará aprender, superar e caminhar ...  

 Acolher e transcender um carma é como  plantar uma nova árvore, de bons frutos... É criar um “carma bom” para poder desfrutá-lo, em qualquer vida, com alegria.


quarta-feira, 18 de novembro de 2015

PANDEMIA




            Pandemias são epidemias que ameaçam se espalhar por todo o mundo. Ficamos muito assustados quando noticiários nos alertam para essas ameaças! Temos muito medo de doenças que ameacem nossa vida física, nossa permanência por aqui, mesmo com dores e perdas de todo tipo.  Mas parecemos não estar conscientes da mais antiga, e cada vez mais letal, de todas as doenças que atingem nosso Ser em evolução – o medo, a raiva, o ódio, o ressentimento profundo, com justificativas sem fim... E essa pandemia se espalha pelas mídias, pelas redes, pelas conversas, pelas verdades terríveis, pelas mentiras, pelo cultivo contínuo do horror!  Vivemos todos, de todas as cores e lados, sob essa energia densa e doentia. E nela proliferam os loucos radicais, os paladinos nacionais e os “defensores divinos” de suas verdades sagradas.  Nela também se justificam os agredidos, os justiceiros,  os vingadores...  Como irá tudo se acabar? Sobreviveremos? Porque, viver, há muito, já não vivemos...

            Somos Seres Espirituais, mas estamos aprisionados, encalhados, impactados, em nossa caminhada.  Agimos e reagimos, apenas, como animais racionais.   Queremos poder e submeter! Defendemo-nos e atacamos... Invadimos e nos deixamos invadir, exploramos e nos deixamos explorar, numa eterna luta, perdida nos tempos. Quem começou? Quem atirou a primeira pedra? Quando?  Por quê?  E agora?   Como estabelecer um mínimo de ordem e limites nesse caos de ódios?  

             É incrível como essas situações de luta e ódio , refletem  exatamente situações “amorosas”, em família. Confundimos generosidade com permissividade; aceitação com mistura e falta de limites claros que nos permitam sermos quem somos em nossas diferentes histórias e caminhos. Falta respeito – o carro chefe do Amor- entre nós: em casa, em nossas igrejas, em nossos governos, em nossas relações com outros povos. Respeito são regras e limites claros, sinalizados com honestidade e firmeza, sem agressividade, a cada situação. Quando isso não acontece, quando  desrespeitamos ou permitimos que desrespeitem  os necessários  limites e regras, sobrevêm as invasões, as  agressões, a necessidade de revide, o medo, o ódio, o desamor, a infelicidade...   E agora? Está tudo tão difícil! Estamos todos tão envolvidos, indignados e confusos nas disputas...

            Quisera poder trazer paz à minha casa, ao meu país, ao mundo! Quisera que um Deus Amoroso se interpusesse entre todos e trouxesse ordem à casa. Seria uma solução milagrosa, curativa maravilhosa... e cômoda!  Mas, acredito que, se faço parte dessa humanidade tão adoecida, cabe a mim, e cada um de nós, criar meus anticorpos ao ódio, parar de me deixar contaminar mais, estabelecer e honrar meus limites, buscar viver e conviver de modo mais amoroso e respeitoso. A dor do caos que vivemos pode servir para reforçar nossa busca de um viver mais nutrido de Amor, mais nutridor em nossas relações. Afinal, somos seres espirituais a caminho da Casa do Pai. “Doenças, epidemias, pandemias”, podem  nos retardar, mas não podem impedir nossa Centelha Sagrada de buscar sua Origem de Amor.


sexta-feira, 13 de novembro de 2015

ROMARIAS




          Vivemos em romarias, eternos romeiros, “humildes” pedintes, suplicando atenções e cuidados especiais, solicitando, com insistência, nossa saúde tão mal cuidada, o alívio de culpas, de saudades, do desamor e até recompensas e ganhos  materiais...  Acostumamo-nos a pedir/implorar àqueles “mais poderosos”, que habitam os templos, ou diretamente ao Todo Poderoso, no “céu”  de nossas crenças religiosas.   Pedimos, imploramos, queremos e precisamos receber graças e benesses. Achamo-nos merecedores por sermos bons (ou pelo menos melhores), porque necessitamos mais ou porque somos ainda pobres pecadores.  Não importa a justificativa, queremos sempre mais, estamos sempre em busca do receber. E quando recebemos, agradecemos com velas, testemunhos, rituais... Mas logo buscamos mais, porque a vida é cheia de desafios, doenças, dívidas, abandonos, sonhos desfeitos, convivências difíceis...  E, mais uma vez, fazemos promessas, com oferendas materiais e sacrifícios, pedindo proteção e atenção, em trocas e barganhas... Buscamos, também, “intermediários” para mais facilmente chegar ao Poder Maior – padres, pastores, médiuns, rabis, “santos profetas”, gurus...

            Sacrificamo-nos, insistentes, nessas romarias em busca de alianças poderosas para acessar esse Poder Maior, lá longe, num céu às vezes parecendo tão distante!  Muitos jamais desistem, insistindo sempre no mesmo caminho e modo de romaria. Outros, tentam variar os caminhos e o modo, mas  no mesmo sentido na romagem. Outros, ainda, tudo abandonam, tornam-se “romeiros desencantados” de chegar a esse Poder Superior e passam até mesmo a duvidar da existência desse Poder Amoroso.

Acredito, hoje, que nossa caminhada precisa ser  num outro sentido. Nossa romaria deve ser na direção da força e poder dessa Centelha Divina que  habita nosso templo interior. Para chegar cada vez mais perto dela preciso empreender uma romaria interior, santa e libertadora, sem barganhas, sem manipulação ou auto engano, sem  comparações, sem justificativas, com honestidade, com bom humor, com generosidade...

             E então, vamo-nos descobrindo romeiros de nós mesmos! Romeiros humildes, que reconhecem precisar de força, orientação e conforto nos momentos difíceis... E fortalecidos, já não suplicamos por coisas, pessoas, situações... Até nos surpreendemos pensando: O que posso Oferecer, livremente, sem trocas?    Queremos compartilhar, estar juntos, abraçando, acreditando, consolando... Dando testemunho da alegria e serenidade dessa nova romaria.

 Seremos novos romeiros com a Aceitação  de quem Confia e se Entrega ao Amor e Sabedoria desse Poder Maior, agora tão próximo!  


domingo, 8 de novembro de 2015

DISTÂNCIAS




          Aprendemos a amar ligados, “plugados”, sem limites, “juntos e misturados”, sem espaços, sem distâncias... como um só “bloco de amor”. Não admitimos distâncias físicas ou afetivas. Sentimos uma necessidade que não se esgota de estarmos bem juntos. Temos muito medo de nos afastarmos e nos perdermos uns dos outros!  Tornamo-nos atentos e controladores, possessivos e ciumentos dos nossos “objetos” tão amados. – nossos pais, nossos filhos, nossos companheiros...  E reagimos às mudanças, aos elementos novos, a quaisquer novas situações que “ameacem” nossa união!

            Mas a Vida parece não acreditar nisso e nos empurra para  longe, e/ou até muito mais longe, criando os espaços necessários para crescermos. O filho que nasce, depois desmama, vai para a escola, para o trabalho, escolhe outras companhias, forma uma outra família ou aquele que viaja e se transfere para muito longe... E os nossos amados que são chamados para uma outra dimensão...  Todos, cada vez mais longe... 

            A Vida vai, naturalmente, nos “desplugando” para que possamos  aprender a “Viver e Deixar Viver”, para nos deixar descobrir nossos dons únicos, nossas potencialidades, nossas possibilidades...e deixar e que os outros também se descubram. Para podermos ir escrevendo, de modo particular, a nossa história. Precisamos de espaço para aprendermos a “dançar” na vida,  criando e  adequando nossos próprios passos e respeitando os ritmos uns dos outros.

            Mas como é doído, e ainda tão difícil, amar desligado, deixando um espaço cada vez mais claro e respeitoso entre nós e aqueles que amamos!    Ainda queremos ter notícias a toda hora, se possível em tempo real! E usamos de toda tecnologia para nos mantermos juntos (celulares, fotos, vídeos...) e de tantos pretextos para estar na vida e no espaço do outro ( “ajudar”, orientar, precisar...)  E é mais doído e difícil ainda, quando a vida nos distancia radicalmente, fisicamente, definitivamente( nessa passagem) ... Aqueles que amamos ficam incomunicáveis (!?),  estão inacessíveis ao nosso toque, aos nossos olhos... E suplicamos em prece muda :“Eu só queria saber, como vai você!”

            Ainda temos muita dificuldade de estar fisicamente distantes. E de estarmos sós!  Mas como lembrou o poeta, o Amor precisa de espaço, de uma distância entre nós para que realmente exista, cresça e floresça. Precisamos de uma generosa e gentil distância para sermos de verdade quem somos, para enxergarmos, aprendermos e respeitarmos quem o outro é. O Amor não pode ser esmagado e sufocado pela posse e pelo medo da perda. O Amor precisa da distância pedida e medida pelo Respeito para poder ser uma ponte entre nós.