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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

CENSURA




A censura é a face disfarçada da força, do poder, da negação da liberdade. Preocupa-nos a censura na política, na sociedade, nos países, mas a censura que primeiro nos atinge, e se faz sentir por toda nossa vida, é aquela que recebemos ainda na infância com o propósito de nos orientar, de defender, de cuidar. No entanto, crescemos , ficamos adultos, e tanto a família da infância quanto nossas novas relações tendem a nos manter sob censura, sob supervisão, sob prisão (afetiva). Nosso medo de perdê-las nos faz submissos, aceitando ler numa “cartilha” que, já então, se tornou abusiva.
Os “pode/não pode”, “deve/não deve”, ditos ou não ditos, funcionam como leis e nos congelam, assustados, amedrontados, sob o controle, às vezes invisível, poderoso, daqueles onde buscamos amor e valorização. Sentimo-nos apequenados, infantilizados, paralisados “só com o olhar” ou mesmo só com a lembrança das expectativas de nossos censores. Tememos aborrecê-los, decepcioná-los... tememos as represálias afetivas, as brigas, os amuos, a reprovação, o “gelo”, os silêncios... Para evitá-los, quantas vezes sorrimos disfarçando tristezas (...mas tudo bem! Tô nem aí!), fingimos indiferença para esconder alegrias “inconvenientes” e sozinhos, solitários, às escondidas, choramos dores incompreendidas.
Tentamos assim, de todo modo, defender nossas relações, a qualquer preço! Mas, e se o preço for nossa dignidade, nossa verdade, nossa felicidade? É incoerente querer preservar relações à custa de nos sentirmos coagidos, invadidos por uma raiva surda e constante, envergonhados perante nós mesmos, ficando, afinal, de “saco cheio”!
“Saco cheio” de “engolir sapos”, de sermos desleais conosco. É o resultado de um desvio de conduta, de uma perversão do apetite natural que temos por viver com liberdade, sem disfarces. “Sapos” não são digeríveis e quando nos obrigamos a engoli-los para controle da relação, acabamos por nos tornar vulneráveis a crises de descontrole. “Vomitamos” sentimentos reprimidos, comportamentos forçados, mas, se retornamos às atitudes antigas depois do alívio momentâneo, o “saco” volta a encher e tudo se repete, acabando esse processo perverso por nos adoecer em todos os níveis com uma sensação de incompetência e impotência.
Se nos sentimos assim, podemos dizer que somos felizes, que vale a pena cuidarmos de nossas relações dessa forma?
Aceitar essas “censuras”, veladas ou não, essas interdições ao que somos, queremos, gostamos, ao nosso “passado errado”, é uma deslealdade a nós mesmos! Eu sou a responsável por mim! Estou cuidando bem de mim? Afinal, essa é a minha principal responsabilidade! Não adianta delegá-la às pessoas da minha vida ou me anular por elas. Preciso estar bem para poder amar verdadeiramente, com igualdade e respeito. Não posso mudar os outros, mas se fizer a minha parte a relação ficará menos pesada e abusiva, será arejada pela minha verdade e até pelo meu exemplo. Não posso libertar ninguém, mas posso a mim!
Livrar-nos dessa sujeição às censuras não se faz pela força, pelas lutas, revoltas ou revoluções armadas. É, sim, uma revolução silenciosa, cuidadosa, amorosa, interior. Precisamos estar em contacto íntimo e constante conosco e insistir no exercício de nos expressar com honestidade, com assertividade, sem agressividade, resguardando-nos, dando voz a quem somos. Não adianta acusar e nos ressentir com os censores, com os opressores, com os nossos amores! É nossa responsabilidade aprender, um dia de cada vez, com coragem, paciência, carinho e perseverança, a nos cuidar, a avançar, nos libertar e reafirmar QUEM SOMOS.


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